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quinta-feira, 19 de julho de 2012

Líderes muçulmanos e católicos se encontram para debate

Um grupo de lideranças muçulmanas e católicas reuniram-se no Vaticano para fazer um debate sobre suas relações diante da “situação atual do mundo”.

De acordo com um comunicado oficial do Vaticano, o cardeal Jean-Louis Tauran, presidente do Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-religioso e o presidente do Fórum Islâmico Internacional para o Diálogo, Hamid bin Ahmad Al-Rifaie, presidiram a reunião. Oito muçulmanos e oito representantes católicos participaram da reunião. Os participantes “trocaram opiniões sobre as relações entre cristãos e muçulmanos”, segundo o comunicado.

Uma segunda reunião de dois dias foi agendada em Roma, em julho de 2013, cujo tema será “Os crentes na frente do materialismo e do secularismo”, disse o Vaticano.

Dando continuidade ao diálogo iniciado em 1995, até 2012 foram 17 encontros promovidos.

O Vaticano tem feito reuniões inter-religiosas regulares com estudiosos muçulmanos depois que 138 especialistas muçulmanos escreveram uma carta em 2007, defendendo o diálogo com os cristãos.

A carta chegou depois que o papa Bento XVI fez um discurso em Regensburg, Alemanha em setembro de 2006 citando observações de um imperador bizantino, criticando o Islã por ser uma religião violenta.

O papa posteriormente pediu desculpas aos muçulmanos, pois os comentários causaram uma reação violenta. Ele disse que o verdadeiro significado de seu discurso “era e é um convite ao diálogo franco e sincero, com grande respeito recíproco”.

13 / julho / 2012

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Revista Mundo e Missão - Ecumenismo

Setembro de 2007 - Edição n.º 12
Em Debate é parte integrante da Revista MUNDO e MISSÃO - n.º 115

Torre de Babel - Pieter Brueghel
ecumenismo é uma promiscuidade em pecado, já que pretende agremiar numa só confissão seitas cujo próprio surgimento e a “raison d’être” (razão de ser) são desvios do caminho reto da tradição cristã original. É uma tentativa insólita de se chegar à Verdade através da aceitação simultânea de várias deturpações desta. São as próprias palavras de Jesus Cristo que nos mostram inequivocamente quão infundadas e destituídas de qualquer valor são as afirmativas sobre os benefícios espirituais para a humanidade que o ecumenismo possa trazer.São elas: “... E eu digo-te que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16:18). É óbvio, que esta Igreja já existe e que existe há dois milênios e que é uma só, independentemente do número e da distribuição geográfica dos fiéis por Ela congregados. É de se acreditar que o dito foi suficiente para tornar evidente a vacuidade espiritual do ecumenismo.
(V.Kurgánov, da Igreja Ortodoxa Russa)
s evangélicos são contrários ao ecumenismo porque “continuam crendo que a Reforma foi um avanço espiritual e não um equívoco. Acreditam que os esforços tendentes à unificação não levam em conta as razões reais da separação, a saber, as questões doutrinárias fundamentais. Entendem que o papado no catolicismo romano não é um ofício legítimo da Igreja. Que a maior parte do corpo doutrinário e ensino do catolicismo romano nada tem a ver com os princípios bíblicos e nem serve de progresso histórico válido na espiritualidade” (Eloy Melonio, Ecumenismo: Quais os fundamentos da proposta?, Revista Em Defesa da Fé, n.º 24).
termo ecumênico originou-se do grego oikoumene, derivado da palavra oikos: casa, lugar onde se vive, onde as pessoas têm um mínimo de bem-estar.
A expressão é utilizada em sentido religioso e representa o esforço de unidade entre as religiões cristãs, a pedido de Jesus a seu Pai:
“Para que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim e eu em ti; para que sejam um em nós, a fim de que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17,21). Entretanto, surgidas ao longo da história, as divergências afastaram os cristãos de um convívio comum. As mais graves aconteceram nos séculos 11 (cisma ortodoxo) e 16 (cisma protestante).
s pentecostais e os neo-pentecostais, em geral, e os batistas, têm dificuldade com o ecumenismo. Em primeiro lugar porque, segundo eles, seria uma nova estratégia da Igreja católica para reconverter os “crentes” ao catolicismo. Do outro lado, o ecumenismo impediria o proselitismo (conquista de adeptos), que é a maneira pela qual muitos grupos evangelizam, uma vez que, para eles, quem não lhes pertence não se salva.
á grupos contrários ao ecumenismo também entre os católicos (a ponta extrema é a Fraternidade São Pio X, fundada pelo bispo Lefèbvre). Tradicionalistas e conservadores receiam que o diálogo ecumênico possa enfraquecer a genuína fé católica e gerar confusão entre os fiéis.
m geral, nota-se pouco interesse pelo ecumenismo dentro da Igreja católica (em nível de sacerdotes e leigos). As iniciativas ecumênicas são muito raras, a impulsividade dos pentecostais assusta e põe os católicos em defensiva. Há – de lado a lado – muita ignorância e preconceito sobre as outras confissões cristãs.

Irmãos e irmãs do Caribe, da América Central e do Sul em preparação para a 9.ª Assembléia Geral d0 CMI

“Todos os cristãos se professam discípulos do Senhor, mas têm pareceres diversos e caminham por rumos diferentes, como se o próprio Cristo estivesse dividido. Esta divisão, porém, contradiz abertamente a vontade de Cristo, e é escândalo para o mundo, como também prejudica a santíssima causa da pregação do evangelho a toda criatura”
(Concílio Vaticano II – Unitatis redintegratio, 1)
uando é que nós, cristãos, teremos a lucidez e a coragem de reconhecer que nossa falta de unidade é uma causa fundamental de ateísmo?”
(Giuseppe M. Zanghí, filósofo e teólogo)
iante dos enormes problemas que o mundo enfrenta, diante da responsabilidade que temos de levar à frente o projeto de Deus para que a humanidade se realize plenamente e seja feliz, os cristãos retardam o avanço da história. Diante das tragédias da humanidade, opostas ao plano de Deus, podem os cristãos continuar se dando ao luxo atroz de trabalharem desunidos?”
(Enrique Cambón, teólogo)

s cristãos, pelo menos eles, renunciem a suas divisões, a suas posições, que se reconciliem, já que têm como ponto de referência um Deus que é Amor!”
(Roger Schutz, fundador da Comunidade de Taizé)


“Estou convencida que Deus não abandonou nenhuma das Igrejas durante estes séculos de divisão. Portanto, amanhã, com a reunificação, cada Igreja unida às outras, refletindo justamente a unidade de Deus, não só manterá a característica particular que foi desenvolvendo ao longo dos séculos, mas colocando-se em comunhão com todas as outras Igrejas, completar-se-á, fortalecer-se-á. Por isso, cada Igreja tornar-se-á, de certo modo, uma ‘especialista’ daquele determinado aspecto de verdade que ela mesma, ao longo dos séculos, foi aprofundando.”
(Chiara Lubich, fundadora do Movimento Focolare)

uvistes dez mil histórias sobre nós, que somos chamados protestantes. Se credes em apenas um milésimo destas histórias, deveis pensar muito mal de nós. (...) Daí se destrói completamente o amor fraternal; e cada grupo, encarando o outro como monstro, dá lugar à ira, ao ódio, à maledicência, a todo sentimento não-amistoso que, frequentemente, tem resultado em barbaridades desumanas, quase desconhecidas entre os pagãos.”
(John Wesley, fundador da Igreja Metodista)
nova atitude mental que o ecumenismo exige (...) leva cada Igreja a colocar Jesus Cristo no centro de seu sistema referencial, e não ela mesma, convencendo-se de que, se existe um retorno a ser feito, este cabe a cada uma delas de modo idêntico.
Este retorno é uma subida árdua do rio da história de cada Igreja, carregado de conquistas espirituais, mas também poluído pelas infidelidades de seus filhos, para chegar à nascente, onde encontramos a água pura da Palavra de Deus vivida com radicalidade e generosidade, e que nos revela o contorno preciso da Igreja de Jesus.”
(Sandra Ferreira Ribeiro, teóloga)
ecumenismo é um processo lento, às vezes desanimador, quando caímos na tentação de sentir e não escutar, de falar sem convicção, porque não é sempre fácil abandonar o conforto. Mas se o ecumenismo é uma estrada lenta e íngreme, como toda via de penitência, é também um caminho que, apesar de suas dificuldades, apresenta amplos espaços de alegria, paradas refrescantes, e permite também respirar a plenos pulmões o ar da comunhão.”
(Papa Bento XVI, durante a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, janeiro de 2007)
Igreja e igrejas

Encontro de Água - Declaração Ecumênica sobre a água como Direito Humano e bem público

mbora separadas, as Igrejas orientais têm verdadeiros sacramentos e, sobretudo, em virtude da sucessão apostólica, o Sacerdócio e a Eucaristia. Assim, são consideradas pela Igreja de Roma como “Igrejas particulares ou locais”. As comunidades cristãs, nascidas da Reforma do século 16, não têm a sucessão apostólica no sacramento da Ordem.
Segundo a doutrina católica, elas não conservam a genuína e íntegra substância do Mistério eucarístico e, portanto, não podem ser chamadas “Igrejas” em sentido próprio. Além delas, chamadas igrejas históricas, nasceram posteriormente as comunidades pentecostais e neo-pentecostais.
Concílio Vaticano II exortou “todos os fiéis a que, reconhecendo os sinais dos tempos, solicitamente participem do trabalho ecumênico” (Documento sobre o ecumenismo). Em nível central, isso se realiza através do Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos, criado em 1960. Existem diálogos bilaterais e multilaterais, tanto internacionais quanto em âmbito nacional.
Eis alguns diálogos intereclesiais dos quais a Igreja católica participa:
– Com as Igrejas Ortodoxas, a partir do “diálogo da caridade” iniciado na década de 1970 entre o patriarca Atenágoras e o papa Paulo VI.
– Com a Igreja Copta (uma antiga Igreja oriental). A partir de 1974, depois da declaração entre Paulo VI e o papa copta Shenouda III sobre divergências apenas de linguagem e não de doutrina.
– A Igreja católica vem mantendo diálogos constantes com as chamadas Comunidades da Reforma.
Conheça alguns documentos comuns: Com luteranos:
Declaração conjunta sobre a Doutrina de Justificação (1999).
Com a Aliança Reformada Mundial: - Para uma compreensão comum da Igreja (1990).
Com Anglicanos: Igreja como comunhão (1991).
grande teólogo reformado Oscar Cullmann afirmou:
“Devemos chegar à unidade não apesar, mas através da diversidade”.
Ele elencou os carismas essenciais de cada uma das três grandes tradições cristãs:
1.º Carismas “típicos” do protestantismo:
– a concentração sobre a Bíblia;
– a liberdade cristã, que favorece a abertura para o mundo.
2.º Carismas essenciais do catolicismo:
– a universalidade;
– a instituição (sendo um carisma, a organização protege o espírito: 1 Cor 14,33-40);
– o papado, com a condição de ser concebido como serviço petrino.
3.º Carismas próprios da Igreja ortodoxa:
– aprofundamento teológico do Espírito Santo;
– preservação das formas tradicionais da liturgia.
Iniciativas atuais (2006):

Celebração Ecumênica durante encontro da Conferência sobre História Latino-Americana
– Janeiro. Uma comissão internacional católico-reformada publicou o documento “A Igreja como Comunidade de Testemunho comum ao Reino de Deus”, em comemoração ao processo de diálogo, iniciado em 1970.
– Julho. A “Reunião de cúpula dos Chefes de Estado Religiosos”, promovida pelo Patriarca de Moscou, Alexis II, solicitou a adesão da Santa Sé.
– Novembro. O arcebispo de Canterbury e primaz da Comunhão Anglicana reza com o papa no Vaticano. Visita apostólica do papa à Turquia e encontro com Sua Santidade Bartolomeu I.
– Dezembro. O arcebispo de Atenas, Sua Beatitude Christodoulos, visita o papa no Vaticano.
1.º Renovação da Igreja, para que seja, cada vez mais, fiel ao evangelho.
2.º Conversão do coração (humildade, fraternidade, reconhecimento mútuo das faltas contra a unidade).
3.º União na oração, para impetrar a graça da unidade.
4.º Conhecimento mútuo: estudo das outras igrejas, segundo a verdade e na caridade.
5.º Formação ecumênica: o estudo da teologia e da história deve ser ministrado do ponto de vista e com sensibilidade ecumênica.
6.º Cooperação no campo social para enfrentar juntos, como cristãos, os problemas da nossa época.

CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 2010 SERÁ ECUMÊNICA
Oração durante encontro ecumênico

presidente do CONIC, pastor Carlos Möller, recebeu do presidente da CNBB, dom Geraldo Lyrio Rocha, no dia 20 de agosto, a comunicação de que a Assembléia dos Bispos aprovou, em maio, o pedido de mais uma Campanha da Fraternidade Ecumênica em 2010 (a primeira foi em 2000 e a segunda em 2005). O pastor Carlos lembrou que o CONIC comemora, neste ano, 25 anos de fundação e para celebrar a data será realizado, de 15 a 17 de setembro, o Seminário “Ecumenismo e Missão – Para que todos sejam um”.

ECUMENISMO NÃO É DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO
nquanto o ecumenismo propõe a unidade entre os cristãos (católicos, protestantes, ortodoxos), o diálogo inter-religioso é um canal aberto entre cristãos e não-cristãos (judaísmo, islamismo, budismo, hinduísmo,...).
ESTRUTURAS ECUMÊNICAS

Celebração da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos 2005:
Dom João Braz; Pastor Luterano Renato Kühne e o
Bispo Anglicano Maurício de Andrade
• Conselho Mundial das Igrejas (CMI)
A principal organização ecumênica cristã mundial foi fundada em 1948, em Amsterdam, Holanda. Tem sede em Genebra, Suíça. Congrega mais de 340 denominações cristãs, que representam 500 milhões de fiéis, em 120 países, pelo menos.
Seu secretário geral atual é Samuel Kobia, metodista. A Igreja católica romana não participa da organização, mas mantém com ela grupos de trabalho em alguns departamentos, como a Comissão de Fé e Ordem e a Comissão de Missão e Evangelismo.
• Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC)
No Brasil, as Igrejas: - católica apostólica romana, católica ortodoxa siriana do Brasil, cristã reformada e as Igrejas protestantes históricas: - luterana, metodista, presbiteriana unida e episcopal anglicana do Brasil, pertencem ao CONIC, com sede em Brasília – DF. A entidade foi fundada em 1982. Procura aproximar as igrejas cristãs, promovendo debates e encaminhamentos práticos que levem à sua integração e à comunhão.
CURSOS SOBRE ECUMENISMO
CESEP – Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular
• Site: www.cesep.org.br • E-mail: cesep@cesep.org.br • Tel.: (11) 3105-1680


http://www.pime.org.br

Ecumenismo, sim... mas qual?


  Apresento aqui algumas ponderações sobre o ecumenismo. 
Que é ecumenismo?
É um belíssimo movimento de fé e amor suscitado pelo Espírito Santo no coração de tantos cristãos de diversas comunidades eclesiais no sentido de rezar e trabalhar com esforço sincero para conseguir uma maior unidade entre os cristãos. Assim, a finalidade última do movimento ecumênico é a unidade visível da Igreja de Cristo, expressa na comunhão de fé e amor entre todos os que têm o nome de cristãos. Sendo assim, o ecumenismo dá-se somente entre as comunidades cristãs, isto é, aquelas que aceitam Jesus como Senhor, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, Salvador do mundo, e professam a Santa e Indivisa Trindade do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Neste sentido, não são cristãos os espíritas, as testemunhas de Jeová, os mórmons...Com eles, não se deve falar em ecumenismo: com os não-cristãos faz-se diálogo inter-religioso, que é a busca de um respeito recíproco para trabalhar em prol do bem comum e dos valores humanos universais. Então, a palavra-chave para o ecumenismo é unidade; já para o diálogo inter-religioso, a palavra-chave é respeito. 
As igrejas cristãs são todas iguais?
            Para que se coloque o ecumenismo em prática de modo correto, é necessário compreender a doutrina católica sobre a Igreja e suas relações com os outros cristãos! A nossa fé é claramente exposta pelo Concílio Vaticano II:
(1) A Igreja é necessária para a salvação, porque Cristo, o único Salvador, quis a Igreja, fundou a Igreja e deu-lhe a missão de continuar sua missão: “Cristo, Mediador único, constitui e sustenta indefectivelmente sobre a terra, como organismo visível, a sua Igreja santa, comunidade de fé, de esperança e de caridade, e por meio dela comunica a todos a verdade e a graça” (LG 8). Então, a Igreja não é facultativa ou sem importância: aderir a Cristo exige a pertença à sua Igreja, pela qual Cristo fala e na qual Cristo dá a salvação, sobretudo nos sacramentos da fé.
(2) Esta Igreja de Cristo é única e permanece de modo pleno somente na Igreja católica, fundada por Cristo: “Esta é a única Igreja de Cristo, que no Símbolo (= Credo) professamos una, santa, católica e apostólica, e que o nosso Salvador, depois da sua ressurreição, confiou a Pedro para que ele a apascentasse, encarregando-o, assim como aos demais apóstolos, de a difundirem e de a governarem, levantando-a para sempre como ‘coluna e sustentáculo da verdade’. Esta Igreja, como sociedade constituída e organizada neste mundo, subsiste (= permanece inteira, continua íntegra na sua essência) na Igreja católica, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos bispos em comunhão com ele” (LG 8).
(3) E as outras comunidades cristãs? O Concílio ensina que elas têm elementos da Igreja de Cristo e afirma claramente que fora do corpo visível da Igreja católica há inúmeros elementos de santificação e verdade (cf. LG 8); e os cita: “a palavra de Deus escrita, a vida da graça, a fé, a esperança e a caridade e outros dons interiores do Espírito Santo e elementos visíveis” (UR 3). O Concílio também afirma que os atos de culto de nossos irmãos separados são canais de graça e podem conduzir à salvação: “Também não poucas ações sagradas da religião cristã são celebradas entre os nossos irmãos separados... estas ações podem realmente produzir a vida da graça e devem mesmo ser tidas como aptas para abrir a porta à comunhão e à salvação” (UR 3). Portanto, o Espírito do Ressuscitado serve-se também dessas comunidades separadas da Igreja católica: “As igrejas e comunidades separadas, embora creiamos que tenham defeitos (na profissão de sua fé, na sua doutrina e práxis eclesial), de forma alguma estão despojadas de sentido e de significação no mistério da salvação. Pois o Espírito de Cristo não recusa servir-se delas como meio de salvação cuja força deriva da própria plenitude de graça e verdade confiada a Igreja católica” (UR 3).
(4) Nossos irmãos não-católicos não estão visivelmente na plena comunhão da Igreja de Cristo, que somente se realiza na Igreja católica: “Os irmãos separados, quer como indivíduos, quer como comunidades e igrejas, não gozam daquela unidade que Jesus quis prodigalizar a todos os que regenerou e convivificou num só corpo e numa vida nova; unidade que as Sagradas Escrituras e a venerável Tradição da Igreja abertamente declaram. Porque só pela Igreja católica de Cristo, que é o instrumento geral da salvação, pode ser atingida toda a plenitude dos meios da salvação” (UR 3).
            Estes pontos, aqui apresentados mostram-nos o quanto é firme e coerente a posição da Igreja na questão ecumênica. O Concílio nada mais fez que reafirmar a fé constante da Igreja de Cristo. Uma coisa deve ter ficado clara: ecumenismo não é relativismo (dizer que todas as religiões são iguais e têm o mesmo valor), não é irenismo (fazer de conta que dá pra ficar tudo como está, aceitando a doutrina uns dos outros como se essa Babel doutrinal fosse vontade de Cristo e estivesse de acordo com a doutrina dos Apóstolos) nem tampouco é sincretismo (mistura de religiões e de ritos). Então, cuidado com a palavra “ecumenismo”: pode prestar-se a tristes enganos!
            Vejamos, agora, algumas questões práticas, ligadas ao ecumenismo. 
(1) Um católico pode participar de um culto protestante ou das reuniões de uma religião não-cristã?
Se se trata de um culto de formatura, de um casamento a que se foi convidado, de um funeral, sim. Se, ao invés, se trata de fazer aquelas famosas “visitas”, não! Para que um católico participe de um culto evangélico, é necessário que haja um motivo extraordinário, como uma celebração ecumênica, com a presença de representantes da Igreja católica. Em geral os católicos que participam de cultos protestantes não têm suficiente formação doutrinal católica e terminam por misturar tudo e até por abandonar a fé católica. Além do mais, quando um protestante convida um católico para ir ao culto, fá-lo não com intenção ecumênica e fraterna, mas com o intuito de proselitismo, isto é de “converter” o católico... como se um católico não fosse cristão!
Pior ainda seria participar de um culto espírita, de uma reunião das testemunhas de Jeová ou dos mórmons... ou de uma “missa” ou quaisquer outros sacramentos administrados na “Igreja” Brasileira. Esses sacramentos são todos provavelmente inválidos! 
(2) Pode-se fazer celebrações ecumênicas de formatura e outros eventos?
Em princípio sim. Mas é necessário, em cada caso, a permissão do Bispo. Não basta a vontade do padre! Além do mais, uma celebração ecumênica não é ir cada um pra rezar do seu modo, quase que ignorando o outro; ao invés, deve ser preparada com antecedência pelos ministros das diversas comunidades que participarão da celebração, de modo que seja uma celebração só, toda integrada e na qual cada um exerça um papel, em unidade e comunhão. Caso contrário, é melhor que não haja celebração ecumênica!
É importante notar que não se faz celebração ecumênica com os não-cristãos (espíritas, por exemplo). Quando o Papa reuniu todas as religiões em Assis, no momento da oração cada grupo religioso fez a sua separadamente, em locais separados. O Papa somente rezou junto com os cristãos!
Também não se deve organizar celebração ecumênica aos domingos, para não atrapalhar a participação da missa. Se um católico participa de uma celebração ecumênica num domingo, de modo algum está dispensado da missa dominical!
A Igreja católica não faz celebração ecumênica com as “Igrejas” Brasileiras, pois não reconhece estas últimas como igrejas. Não reconhece seus sacramentos nem seus ministros, nem faz nenhum tipo de diálogo ecumênico com elas, pois não crê na idoneidade de seus ministros que, em geral, enganam o povo fazendo-se passar por católicos e imitando tudo que é da Igreja católica! Um católico que celebre qualquer sacramento nas “Igrejas” Brasileiras peca gravemente e simula a celebração dos sacramentos! 
(3) Um católico pode casar-se com um não-católico?
Pode, desde que tenha a licença do Bispo. Para isso é necessário que a parte não-católica se comprometa a respeitar a religião da parte católica e que o católico se comprometa a fazer o possível para que os filhos sejam educados na fé católica. Se não for possível, em último caso, que os filhos sejam educados como cristãos até que possam optar livremente pela religião do pai ou da mãe.
Caso um católico case-se com um não-católico sem a devida permissão canônica, incorre em pecado grave e seu casamento é nulo para a Igreja católica. 
(4) Um católico pode participar de estudos bíblicos com os irmãos protestantes?
Em princípio sim. O problema é que na atual situação do Brasil, esses estudos não têm o objetivo de fazer crescer na comunhão e no amor a Jesus, mas de querer “converter” os católicos, fazendo-se uma leitura ridicularmente fundamentalista da Palavra de Deus, que termina por trair o sentido da mesma. Em geral, os católicos que fazem esses “estudos” com os irmãos protestantes são despreparados e terminam completamente confusos. Sendo assim, na nossa situação, um católico que deseje conhecer mais a Palavra de Deus vá participar de um dos cursos bíblicos promovidos pela Igreja. Na nossa Arquidiocese há muitíssimos e de boa qualidade! Expor a nossa fé a riscos desnecessários é temeridade e, portanto, pecado! 
(5) A Igreja católica aceita o batismo dos cristãos não-católicos?
Em geral sim, desde que batizem em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, utilizando água. Com certeza batizam validamente: a Igreja Episcopal Anglicana, a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, a Igreja Evangélica Luterana do Brasil, a Igreja Metodista.
Apesar de terem uma visão deficiente sobre este sacramento, a Igreja aceita também o batismo das seguintes comunidades: presbiterianos, batistas, Igrejas congregacionais, adventistas, a maioria das igrejas pentecostais e Exército da Salvação.
A Igreja tem dúvidas sobre o batismo dos pentecostais que batizam só em nome de Jesus, da Igreja Pentecostal Unida do Brasil e das chamadas Igrejas Brasileiras (são ao redor de 30). Se alguém batizado nessas comunidades pedir para entrar na Igreja católica, deve ser batizado sob condição (“Se não és batizado, eu te batizo em nome do Pai...”)
Com certeza, batizam invalidamente: as Testemunhas de Jeová, os mórmons e a Ciência Cristã. 
            Espero que tenham ficado claros estes pontos. Lembremo-nos que todos aqueles que crêem que Jesus é Senhor e Deus são cristãos e nossos irmãos. Podemos nos ajudar tanto na vida diária e dar juntos um belo testemunho de amor a Jesus, apesar daquilo que nos separa. O Senhor deseja para nós a unidade na sua única Igreja. Quanto aos não-cristãos, devem ser respeitados na sua consciência e opção religiosa. Quanto aos ateus, devem ser também respeitados e acolhidos. Que vendo nosso carinho e respeito para com eles, possam descobrir em Cristo o Deus verdadeiro!

Papa João Paulo II visita Taizé

O Papa João Paulo II decidiu fazer uma paragem em Taizé durante a sua viagem a França. Estava desde a véspera em Lyon e também se devia deslocar a Paray-le-Monial, Ars e Annecy.


Puseram-se tendas em frente da Igreja da Reconciliação. Chegaram sete mil jovens. Durante toda a noite, alguns deles revezaram-se numa oração contínua, silenciosa, que se prolongou até de manhã cedo. Às 8:30, depois de terem cantado muito tempo com os jovens, os irmãos saíram da igreja para acolherem o Papa. Um nevoeiro espesso cobria toda a região. Os helicópteros tiveram de ficar no hangar. O Papa veio de Lyon num carro normal.

Depois de entrar na Igreja da Reconciliação, João Paulo II sentou-se numa cadeira de madeira e palha. O irmão Roger, rodeado de algumas crianças, dirigiu-lhe umas breves palavras de boas-vindas. De seguida, o Papa falou aos jovens. Explicou-lhes por que razão veio a Taizé e o que a Igreja espera deles:
A Igreja precisa do vosso entusiasmo

«(…) Como vós, peregrinos e amigos da comunidade, o Papa está só de passagem. Mas passa-se por Taizé como se passa perto de uma fonte. O viajante pára, mata a sede e continua o seu caminho. Os irmãos da comunidade, como sabeis, não querem deter-vos. Querem, na oração e no silêncio, permitir-vos que bebais a água viva prometida por Cristo, que conheçais a sua alegria, que reconheçais a sua presença, que respondais ao seu chamamento, e depois que torneis a partir para dar testemunho do seu amor e servir os vossos irmãos nas vossas paróquias, nas vossas cidades e aldeias, nas vossas escolas, nas vossas universidades e em todos os vossos locais de trabalho.

Hoje em dia, em todas as Igrejas e comunidades cristãs e até entre os mais altos responsáveis políticos do mundo, a comunidade de Taizé é conhecida pela confiança, sempre cheia de esperança, que deposita nos jovens. É sobretudo porque partilho dessa confiança e dessa esperança que estou aqui esta manhã.

Caros jovens, para levar ao mundo a alegre notícia do Evangelho, a Igreja precisa do vosso entusiasmo e da vossa generosidade. Sabeis que pode acontecer que os mais velhos, depois da marcha difícil ou das dificuldades que enfrentaram, sejam tomados pelo medo ou pelo cansaço e deixem enfraquecer o entusiasmo próprio de toda a vocação cristã. Também pode acontecer que as instituições, por causa da rotina ou das deficiências dos seus membros, já não estejam suficientemente ao serviço da mensagem evangélica. A Igreja tem então necessidade do testemunho da vossa esperança e do vosso ardor para melhor cumprir a sua missão.

Não vos contenteis com a crítica passiva ou esperando que as pessoas ou as instituições fiquem melhores. Ide até às paróquias, às capelanias, aos diversos movimentos e comunidades, e levai-lhes com paciência a força da vossa juventude e os talentos que haveis recebido. Levai o vosso apoio confiante aos ministros da Igreja; eles são os vossos servos em nome de Jesus, e por isso precisais deles. A Igreja precisa da vossa presença e da vossa participação. Se permanecerdes no interior da Igreja, sereis por vezes, como é óbvio, feridos pelas divisões, pelas tensões internas e pelas misérias dos seus membros, mas recebereis de Cristo, que é a sua cabeça, a sua Palavra de verdade, a sua própria Vida, o Sopro do amor que vos permitirá amá-lo fielmente e sentir-vos realizados ao arriscar a vossa vida num alegre dom aos outros. (…)»

Depois de ter falado, o Papa ajoelhou-se para alguns instantes de oração no meio dos irmãos. Todos cantaram: «Laudate omnes gentes, laudate Dominum» («Louvai o Senhor todos os povos da terra»). Enquanto os jovens continuavam a cantar na igreja e nas tendas, o Papa desceu para uma sala contínua onde se ia encontrar com os irmãos. Saudou-os um a um e depois falou à comunidade.
Tornaste-vos ainda mais jovens

O Papa lembrou os irmãos que conhecia pessoalmente a comunidade desde há muito tempo: «Visitei-vos quando éreis mais jovens. Mas hoje tornaste-vos ainda mais jovens.» Lembrava-se das viagens do irmão Roger à Polónia e das suas palavras sobre a Virgem Maria e sobre o ministério do pastor universal. João Paulo II disse então que «se sentia evidentemente obrigado, não exteriormente mas no seu coração, a vir ver-vos.» Fazendo referência aos dois Encontros Europeus de Jovens que já se realizaram em Roma, o Papa acrescenta: «Roma está sempre aberta à vossa visita com os jovens.»

Em seguida, o Papa deixou à comunidade uma mensagem escrita que comoveu muito os irmãos. O irmão Roger incluiu depois esta mensagem no livro As Fontes de Taizé, que resume as intuições essenciais da vida da comunidade.
«Essa pequena Primavera!»

Caros irmãos, na intimidade tão familiar deste breve encontro, eu gostaria de vos expressar o meu afecto e a minha confiança com estas simples palavras, pelas quais o Papa João XXIII, que tanto vos amava, saudou um dia o irmão Roger: «Ah, Taizé, essa pequena Primavera!»

O meu desejo é que o Senhor vos guarde como uma Primavera que desponta e que ele vos guarde pequenos, na alegria evangélica e na transparência do amor fraterno.

Cada um de vós veio aqui para viver na misericórdia de Deus e na comunidade dos irmãos. Consagrando-vos a Cristo com todo o vosso ser, por amor a ele, encontrastes uma e outra.

Mas mais ainda, sem o ter procurado, vistes chegar até vós, aos milhares, jovens vindos de todo o mundo, atraídos pela vossa oração e pela vossa vida comunitária. Como não pensar que estes jovens são o dom e o meio que Deus vos oferece para vos estimular a permanecer juntos, na alegria e na frescura de uma entrega, como uma Primavera para todos os que buscam a vida verdadeira? 

Nos vossos dias, o trabalho, o repouso, a oração, são vivificado pela Palavra de Deus que se apodera de vós, vos guarda pequenos, isto é filhos do Pai celeste, irmãos e servos de todos na alegria das Bem-aventuranças.



Não esqueço: na sua vocação única, original e até, em certo sentido, provisória, a vossa comunidade pode suscitar a admiração e encontrar a incompreensão e a dúvida. Mas, por causa da vossa paixão pela reconciliação dos cristãos numa comunhão plena, por causa do vosso amor pela Igreja, estou certo de que sabereis continuar a estar disponíveis à vontade do Senhor.

Escutando as críticas ou as sugestões dos cristãos das diferentes Igrejas e comunidades cristãs para reter o que é bom, permanecendo em diálogo com todos, mas não hesitando em expressar as vossas expectativas e os vossos projectos, não decepcionareis os jovens e contribuireis para que nunca esmoreça o esforço desejado por Cristo para conseguir reencontrar a unidade visível do seu Corpo, na plena comunhão de uma mesma fé.

Vós sabeis o quanto, pela minha parte, considero o ecumenismo como uma necessidade que me compete, uma prioridade pastoral no meu ministério, para o qual conto com a vossa oração.

Querendo ser vós mesmos uma «parábola de comunidade», ajudareis todos os que encontrardes a serem fiéis à sua pertença eclesial, que é o fruto da sua educação e escolha de consciência, mas também a entrar sempre mais profundamente no mistério de comunhão que é a Igreja no desígnio de Deus.

Pelo dom que concede à sua Igreja, Cristo liberta, com efeito, em cada cristão as forças do amor e dá-lhe um coração universal de artesão de justiça e de paz, capaz de unir à contemplação uma luta evangélica para a libertação integral do homem, de todo o homem e do homem todo.

Caros irmãos, agradeço-vos por me terdes convidado e por assim me terdes dado a oportunidade de voltar a Taizé. Que o Senhor vos abençoe e vos guarde na sua paz e no seu amor!

Chegou a hora da partida. João Paulo II saiu, aproximou-se do carro, depois decidiu de forma imprevista voltar à igreja a fim de saudar os jovens uma última vez. «Devo confessar-vos que vos deixo», diz-lhes o Papa. «E com tristeza. Mas o Papa tem de obedecer! Tem muitos superiores!» Houve muitos risos, logo seguidos por aplausos, e os cânticos recomeçaram, acompanhando a partida do Papa.


segunda-feira, 2 de julho de 2012

Contribuição Camaldulense Para A Paz

Moscou, Maio de 1995. Uma pequena e estranha delegação de leigos e religiosos está desenvolvendo na capital russa uma missão secreta. Está tentando a mediação entre a Rússia de Yeltsin e a República autônoma da Chechênia. O pedido de mediação foi dirigido aos “inexperientes mediadores” por expoentes da cultura Tchetchênia e por alguns pacifistas russos, através de uma associação de leigos católicos que possui o expressivo nome de “Andorinha Cidadela da Paz”. Foi aceita pelas autoridades russas.
“Andorinha Cidadela da Paz” nasceu por obra de um grupo de jovens leigos católicos da diocese de Arezzo, que há anos tem como ponto de referência espiritual o Sacro Eremo e Mosteiro de Camáldoli e o convento franciscano de La Verna, S. Francisco, o santo da paz, por excelência, ali recebeu os estigmas como sinal da sua total conformação ao amor de Cristo crucificado. Por causa desta ligação espiritual dos membros da associação aos dois lugares sagrados da diocese de Arezzo, naqueles dias fizeram parte da delegação da paz também o Prior Geral da Congregação Camaldulense, Dom Emanuele, o guardião do sacro convento, Pe. Fiorenzo, juntamente com o Vigário Geral da diocese de Arezzo, Pe. Franco. 


Uma delegação desarmada sob todos os aspectos, mas respeitada e digna de crédito pela sua experiência religiosa e pela acolhida humana aberta, aos vários protagonistas. Este patrimônio de credibilidade era o fruto, não procurado, mas verdadeiro, de um percurso de mútuo conhecimento e amizade construído a partir de uma iniciativa de paz “em nome do Senhor Jesus”, desenvolvida entre o Natal e a Epifania de 1988-1989. Do Santuário de La Verna, no dia dos Estigmas de S. Francisco, 13 de setembro de 1988, partiu uma mensagem de paz por parte dos jovens “Andorinha Cidadela da Paz” dirigida à Sra. Raíssa, esposa do Presidente Gorbachev, para os jovens russos. Uma mensagem em nome de S. Francisco e do profeta da paz dos nossos tempos que foi o Prof. Giorgio La Pira (+1977), por sua vez profundamente ligado a Camáldoli e “La Verna”, cujo nome para os russos significava paz e amizade, desde os anos da mais áspera guerra fria (anos 1950). 

A mensagem lançada de “La Verna” foi acolhida pela Sra. Raíssa, que tinha tornado possível uma viagem-testemunho dos jovens de Arezzo e dos seus assistentes espirituais (franciscanos e camaldulenses) a vários centros culturais, religiosos e universidades da então União Soviética e ao Patriarcado de Moscou. Nasceu uma autêntica amizade que lhes permitiu crescerem juntos no conhecimento recíproco, estima e confiança. 

Este caminho, desenvolvido a nível de amizade e comunicação espiritual, foi a razão pela qual pôde nascer a excepcional iniciativa de paz em maio de 1995, em Moscou. Excepcional, não pelos resultados conseguidos a nível diplomático e militar, pois a trégua concedida foi rompida em 12 de junho pelo boicote por parte dos “duros” do Kremlin, mas válida pelo reconhecimento do valor atribuído, pelas partes em conflito, às duas comunidades religiosas, pobres de meios humanos, mas ricas da irradiação espiritual evangélica dos seus pais fundadores, Romualdo e Francisco. 

Por que quis recordar este acontecimento no qual uma comunidade monástica foi chamada a desenvolver um papel direto de promoção da paz entre povos em guerra, papel que normalmente cabe a outras instâncias sociais e políticas? Não para reivindicar à comunidade monástica uma função política imprópria, mas para sublinhar a força intrínseca de paz que os valores espirituais, animadores das comunidades religiosas e monásticas, podem exprimir, quando estes são colocados em jogo, com simplicidade e amizade, nas relações humanas que a vida oferece, nas circunstâncias concretas, para além de todo programa institucional. 

“Obedecer à vida” com simplicidade de coração, não é, talvez, a primeira forma de obediência ao amor por parte de todo discípulo de Jesus? O Senhor nos admoesta contra a cegueira da qual permanecem prisioneiros o sacerdote e o levita, mais preocupados com a própria pureza legal que com a vida do homem deixado semimorto pelos ladrões no caminho entre Jerusalém e Jericó. O samaritano de coração generoso assume os riscos. “Vai e faze o mesmo”, é a resposta incisiva de Jesus ao escriba que o interrogava sobre quem fosse o próximo a ser amado. (cfr. Lc 10,29-37).
A pronta e não calculada obediência, que S. Bento requer do monge como primeiro grau da humildade (cf RB 5,1), pode ficar circunscrita aos muros do mosteiro? A história monástica nos ensina que a vida do monge abraça toda a vida, numa entrega confiante de si ao Senhor. É uma entrega que pode levar até à doação da própria vida no martírio. Foi o que aconteceu na Polônia em 1003 a um grupo de discípulos de S. Romualdo, conhecidos como “os cinco irmãos”, e o que aconteceu nos nossos dias aos “sete irmãos” trapistas de Atlas (1996).
O episódio da mediação de paz, tentativa em Moscou, permaneceu circunscrito àquele evento sob o perfil estritamente político. Entretanto, continuou e continua a desenvolver uma frutuosa ação de paz, da qual a comunidade monástica é ao mesmo tempo protagonista e destinatária. Filhos da Rússia e da Chechênia, de Israel e da Palestina, da Abkazia e da Armênia, como de outras nações em guerra entre si, ortodoxos e muçulmanos, hebreus e cristãos, são acolhidos na comunidade da “Andorinha Cidadela da Paz”. Descobrem o valor da paz através da convivência diária entre “Povos diversos” que trazem na própria carne as feridas do ódio e da guerra de seus países de origem e muitas vezes de suas famílias destruídas. Durante três, quatro anos, estudam nas escolas italianas, até conseguirem títulos de estudos e profissão, de modo que se torne proveitoso para suas vidas e para a paz quando retornam às suas respectivas nações. É possível e enriquecedor, entre diversos viver em paz e com respeito. Esta é a mensagem que os jovens, filhos de povos inimigos e de religiões hoje em conflito entre si interiorizam e que se torna o mais precioso patrimônio para suas vidas e para seu empenho social e político.
Durante estes anos tornou-se sistemático o relacionamento periódico de jovens estudantes estrangeiros com a comunidade monástica e com o convento de “La Verna”. É uma educação recíproca entre monges e jovens. Um processo de aprendizagem muito positivo também para a comunidade monástica. Sobretudo nestes anos em que no seu interior vão se acentuando as diferenças de formação cultural e de sensibilidade humana entre gerações e entre nacionalidades diversas que compõem sempre mais também as comunidades monásticas na Europa e Itália. Somos servidores autênticos da paz quando procuramos ser discípulos antes que mestres.
Por estas razões, somente então intuídas, não nos pareceu estranho à nossa identidade de monges responder, naquele momento histórico, ao apelo a um envolvimento direto, ainda que excepcional, numa obra de pacificação multifacetada.


Entre memória e atualidade


Camáldoli é uma comunidade monástica que possui como referencial aquele homem carismático, S. Romualdo, que, apesar de radicado na dimensão solitária da vida monástica, não se poupou na defesa dos pobres contra os poderosos, na pacificação de cidades em guerra, no empenho para a renovação da vida monástica e pela reforma da Igreja. Dele, pode-se repetir com razão, o q ue D. Jean Leclercq escreveu sobre S. Pedro Damião, biógrafo de S. Romualdo: ele foi verdadeiramente “ermite et homme d’église”, eremita e homem da Igreja partícipe das vicissitudes mais animadas do seu tempo.
A fidelidade à memória estimula o repensar do patrimônio da tradição, no confronto com a realidade mutável da historia de ontem e de hoje que exige uma hermenêutica dinâmica. Ela não nos oferece respostas certas, prontas, para enfrentar os desafios de hoje. Expõe-nos ao risco do discernimento e das escolhas. Pode criar também tensões nas consciências e nas comunidades, como, em parte, aconteceu também na comunidade de Camáldoli naquela ocasião. De qualquer forma, nos tira da suposta paz de quem pensa poder viver, no mosteiro ou no eremitério, aquela segurança, garantida pelo passado.
Ser operadores de paz hoje, por parte dos monges e monjas exige, antes de tudo, que as comunidades promovam, no seu próprio interior, o crescimento de pessoas pacificadas em si mesmas, na fidelidade a Deus e à própria humanidade e mantenham relações fraternas nas quais a dinâmica da comunhão das diferenças substitua a igualdade formal, garantida pela uniformidade da observância regular ou pela autoridade do abade. Desafios de grande relevo que monges e monjas encontram no próprio íntimo e dentro da comunidade.
É esta experiência de uma paz sempre em construção que torna monges e monjas companheiros de viagem dignos de crédito e confiáveis para os que procuram em si mesmos uma paz não fictícia e aspiram criar e viver relações não de competição, mas de respeito e valorização das subjetividades, capazes de compartilhar os sofrimentos e as alegrias do outro. Homens e mulheres de coração compassivo, como o do mestre e amigo Jesus.


Na escola dos pais


Camáldoli encontrou nos mestres espirituais da própria tradição este sentido de uma procura da paz humilde e aberta, frágil e forte. Estes mestres nos ensinam que a paz é fruto maduro da experiência de um caminho interior que conhece o não menor combate da intimidade na relação com Deus e que exige a reelaboração total de si mesmo em sintonia com o Espírito do Senhor. Escreve o autor da Consuetudo Camaldolensis, o Prior Rodolfo II (1180): “Existe meditação silenciosa quando se unem indissoluvelmente a regra do calar e a vigilante ocupação do meditar; uma sem a outra não basta à salvação. De fato o silêncio sem a meditação é morte, sepulcro de um homem ainda vivo; a meditação sem silêncio é ineficaz, inútil agitar-se de um homem fechado no sepulcro. Silêncio e meditação unidos, em sentido espiritual, são tranqüilidade para a alma e perfeita contemplação... Para que serve ser silenciosos com a língua, se a vida ou a consciência estão em tempestade?”
Somente uma experiência de luta e pacificação consigo mesmo e de solidariedade cordial e humilde com todo combatente no Espírito pode legitimar o que está escrito de modo relevante na porta de entrada de tantos mosteiros: Pax-Paz! Recordou-nos com a sua aguda sensibilidade Thomas Merton fazendo sua a expressão do poeta inglês Dunn: “Homem algum é uma ilha!” O mosteiro não é uma ilha e paz garantida. Nem pode fazer de si mesmo uma ilha, fechando-se a quem procura caminhos de paz. É, antes, chamado a tornar-se um porto de descanso para reabastecer o barco e retomar às águas. 


Uma dura lição de vida 

Durante a metade do século XX Camáldoli viveu na própria pele a fadiga de construir em seu próprio interior a “comunhão na diversidade”, sintetizada nas relações entre vida cenobítica e vida eremítica, eremitério e mosteiro. Vividas pacificamente por S. Romualdo e seus discípulos por quase cinco séculos, com liberdade e criatividade, próprias dos grandes homens do Espírito, estas duas dimensões inseparáveis da vida monástica camaldulense tinham perdido a sua unidade no século XVI. As duas pombas que bebem no único cálice de Cristo, símbolo do eremitério e do mosteiro, no brasão de Camáldoli, tinham alçado vôo para horizontes separados, ideologizados e muitas vezes conflitantes. Ao longo do milênio, conservara-se apenas um “pequeno resto” da unidade originária na mesma comunidade de Camáldoli, formada pelo Sacro Eremitério e pelo Mosteiro.
Os eventos históricos que conduziram à unidade política da Itália na segunda metade do século XIX trouxeram consigo a supressão de tantas comunidades monásticas entre as quais também Camáldoli. Aquela dispersão de monges não representou somente a perda da vida regular da comunidade e a desapropriação dos seus bens. Incidiu também profundamente na perda da relação com as próprias origens e com sua múltipla tradição. Os sobreviventes, quando foram autorizados a retornar ao S. Eremitério e Mosteiro, concentraram-se no esforço de sobreviver fazendo de seu eixo aquilo que aquela geração tinha conhecido por experiência de vida cotidiana, mas tendo perdido toda relação com as próprias raízes originárias.
Um longo caminho, que durou cerca de 60 anos, deveria levar a redescobir progressivamente as fontes romualdinas e camaldulenses. Deste modo, a secular tradição de Camáldoli, que tinha encontrado a sua característica, exatamente na riqueza e no pluralismo de suas expressões constituía agora, para estes monges, a pergunta mais inquietante. Por que os padres ao longo dos séculos tinham traduzido o carisma de Romualdo em modalidades tão diferentes, de modo a parecer, às vezes, em contradição com aquilo que eles tinham encontrado no S. Eremitério do século XIX e início do século XX? Como enfrentar os desafios da formação das novas gerações de jovens candidatos que, em comparação com eles, pareciam assim tão diferentes? Como enfrentar o risco de uma nova supressão,ainda que só imaginada, mas sempre possível, a não ser procurando reforçar a fidelidade à regra da vida eremítica? Espera-se, deste modo, evitar aquela mesma punição infligida por Deus ao povo de Israel, que, por sua infidelidade, tinha merecido o exílio da Babilônia. 

Rumo a novos horizontes 


Muitas eram as questões que agitavam o ânimo da pequena comunidade eremítica de Camáldoli. Em julho de 1899, o bispo de todo o RS – D.Cláudio José Gonçalves Ponce de Leão – foi a Roma participar do “Primeiro Concílio Latino-Americano” e visitou a Comunidade do Eremitério de Camáldoli. Ele pediu a essa Comunidade enviar alguns monges a fim de animarem espiritualmente as numerosas colônias de imigrantes italianos no Rio Grande do Sul. No dia 12 de outubro daquele ano partiram com ele três monges.
Deram início a uma aventura de grande intensidade humana e espiritual, sustentada por uma forte tensão espiritual e grande solidariedade para com os pioneiros italianos dos quais se fizeram irmãos e pais em tudo e por tudo. Como o bom samaritano! Uma memória viva que surpreendentemente perdura até hoje, como pude experimentar pessoalmente numa recente visita a Caxias do Sul , em 2004. Contudo, os co-irmãos de Camáldoli, que estavam sobretudo preocupados em permanecerem fiéis às suas práticas cotidianas tradicionais, inalteradas por séculos e tidas como imutáveis, tiveram muita dificuldade para compreenderem isso. Assim a grande aventura brasileira foi também um caminho assinalado por incompreensões recíprocas e muito sofrimento, determinados por um zelo sincero, mas pouco iluminado. A guerra ideológica estava em casa. E acompanhou o caminho de toda uma geração.
A penosa via crucis terminou com uma intervenção da autoridade pontifícia, solicitada pelos monges residentes na Itália, que determinou o fechamento da fundação brasileira em 1925. Entretanto, a semente lançada nas consciências da comunidade, ainda que tenha de ter passado pela morte, não deixou de dar frutos inesperados, a longo prazo. As perguntas que acompanharam a redescoberta dos textos e o sentido das tradições recebidas dos mais velhos, cruzavam com a exigência de responder, de modo crível, aos novos desafios que eram colocados pelas novas condições de vida, não somente no Brasil, mas também na Itália. Conservadas vivas, aquelas perguntas impulsionaram a aprofundar cultural e espiritualmente os problemas que tinham gerado.
Foi iniciado um trabalho paciente e fatigante de aprofundamento e de interpretação das fontes camaldulenses. A formação dos novos membros teve a contribuição de pessoas externas, amigas da comunidade, sensíveis à espiritualidade monástica e às novas exigências da Igreja e da sociedade na Itália. Entre estas pessoas ocupou um lugar de grande relevo D. Giovanni Battista Montini, o futuro Papa Paulo VI. Ele se esforçou, a partir dos anos ’30, para promover uma boa formação acadêmica e espiritual aos jovens monges, e ajudou a comunidade a abrir-se à acolhida dos jovens graduados e estudantes universitários católicos. Ele julgava ser importante que estas jovens energias intelectuais da Igreja católica freqüentassem a comunidade monástica para radicar a própria formação espiritual no terreno da grande tradição dos Padres e na oração da Igreja que os monges propunham com o próprio exemplo.
Camáldoli, retomando a tradição de hospitalidade, também cultural, que a tinha caracterizado durante séculos, encontrou-se assim, contribuindo para uma outra etapa importante da Igreja e da sociedade italiana. Em 1943, em plena guerra, um grupo destes estudiosos católicos, reunidos na hospedaria do mosteiro, elaborou o assim chamado “Código de Camáldoli”, texto que contém algumas diretrizes da futura Constituição italiana.
A presença dos intelectuais católicos, prolongada por vários decênios, colocou os jovens monges em contato com as novas sensibilidades sociais e com as correntes inovadoras da teologia católica, especialmente francesa. Aquele novo modo de relacionar-se, de maneira dinâmica, com a própria tradição e com o presente, que a comunidade preparou, gradual e positivamente, contribuiu para o grande evento inovador da Igreja, que foi o Concílio Vaticano II.
A comunidade não chegou aí sem laboriosa preparação. O longo debate interno e os momentos dolorosos que o acompanharam, durante toda a década de 1950, haviam colocado as premissas para que os horizontes inovadores, abertos pelo Concílio, determinassem a pacificação final na comunidade de Camáldoli e orientassem para uma nova etapa do seu caminho. Os líderes que animaram e guiaram esta longa marcha no deserto foram, sobretudo, D. Anselmo Giabbani e D. Benedetto Calati - ambos estudiosos da espiritualidade monástica - e os Priores Gerais entre 1951 e 1987.
A paz na comunidade, expressão não da vitória de um grupo sobre outro, mas de um amplíssimo consenso construído através da busca comum, com paciência e tenacidade, foi por inteiras gerações de monges um forte desafio antes de conseguir ser um dom de Deus que deve ser aproveitado e guardado cuidadosamente. A preciosidade do dom ensinou-lhes a partilhá-lo e a fazerem-se companheiros de viagem com quem o procura. 

Hospitalidade recíproca 


Estas vicissitudes internas e as experiências de encontro com hóspedes qualificados ensinaram a Camáldoli uma atitude interior muito importante. O duplo confronto com a tradição e o presente, com a vida interna da comunidade e com a vida da sociedade, levanta muitas perguntas, até mesmo inquietantes. Este fato requer que se tenham olhos para ver, ouvidos para ouvir e coração para apreciar. A hospitalidade monástica, antes de ser uma atividade de serviço, constitui um modo de ser e relacionar-se com o outro. Nasce da consciência de que a comunidade é chamada, não somente a dar, mas também a receber, pois os dons de Deus são por Ele distribuídos com generosidade e sem discriminação de pessoas. A verdadeira hospitalidade é reciprocidade. Cada um é sempre portador, não somente de necessidades a serem satisfeitas, mas também de dons que podem ser condivididos num recíproco enriquecimento. A mesma fadiga do procurar, que o monge ou a monja experimenta em primeira pessoa, quando é partilhada com humildade, desesperoo (a) de toda presunção e o(a) torna companheiro(a) de viagem de toda pessoa que se confronta com o mistério da própria vida.
Nas sociedades secularizadas do norte, marcadas pela desconfiança, em toda forma institucional de Igreja, esta atitude de atenção para com o outro e de partilha é fundamental para construir pontes de comunicação com a busca religiosa e relações de paz. São Bento nos recorda que no peregrino e no hóspede, qualquer que seja a sua proveniência e a hora na qual se apresenta, é Cristo mesmo que pede acolhida. (RB 53).
Talvez seja por isso que tantas pessoas hoje procuram, quase instintivamente, nos mosteiros, um espaço de acolhida e de partilha para o seu caminho de aprofundamento na fé ou de retomada espiritual. 


Operadores de paz em diálogo 


Diálogo ecumênico, diálogo inter-religioso, diálogo com os não-crentes. Entraram com pleno direito entre os elementos primários que devem caracterizar a formação e a espiritualidade do monge camaldulense e o estilo de vida da comunidade. As novas Constituições indicam o diálogo entre as modalidades primárias, através das quais a comunidade monástica participa eficazmente na missão apostólica da Igreja, com a sua própria existência centrada em Cristo e iluminada pelo Seu Espírito.
O próprio Pontífice João Paulo II, na ocasião da sua visita pastoral à comunidade de Camáldoli, feita no dia 13 de setembro de 1993, retomou esta linha recomendando-a como um dos elementos que devem caracterizar o monge camaldulense no seu caminho com a Igreja, hoje.
Com efeito, a sensibilidade ecumênica e o diálogo com outras confissões cristãs foi iniciado em Camáldoli em 1968, graças à contribuição de uma associação de leigos chamada Segretariato attività ecumeniche, nascida em Veneza nos anos ’50, durante o ministério do Patriarca Giuseppe Roncalli, o futuro João XXIII. Particularmente interessante foi o desenvolvimento que tal orientação teve nas duas comunidades dos Estados Unidos que estreitaram relações de intensa colaboração com uma congregação monástica anglicana – Congregation of Holy Cross – e abriram o eremitério californiano para uma acolhida fraterna a muitos não católicos.
Um ministério ecumênico muito delicado está desenvolvendo o co-irmão chinês, D. Joseph Wong, monge na comunidade de New Camáldoli (EUA). Durante os seus períodos de permanência na República Popular da China, ensinou teologia e espiritualidade monástica em vários seminários da Igreja oficial, contribuindo para sua reaproximação com a Santa Sé. Faz parte da “China Commission” da Confederação Beneditina. Recentemente foi enviado pelo abade de Sta Ottilia (Alemanha), Pe. Jeremias Schroeder, para colaborar numa iniciativa muito especial que tende a promover a formação monástica de membros potenciais de uma futura comunidade beneditina na China. Juntamente com os co-irmãos de New Camáldoli e de Camáldoli, fundou na Califórnia “The Camaldolese Institute of East-West dialog – Instituto camaldulense para o diálogo oriente-ocidente”.
O diálogo inter-religioso teve desenvolvimentos significativos. Em Camáldoli mesmo a experiência mais significativa é conhecida pelo diálogo entre hebreus e cristãos. Iniciado no mosteiro, em 1979, hoje possui o reconhecimento e o sustento por parte da S. Sé e da Conferência Episcopal Italiana e suscitou grupos de “Amicizia ebraico-cristiana” em várias cidades italianas. A trágica história das relações entre cristãos e hebreus, ao longo dos séculos, tornada ainda mais dramática com o holocausto organizado pelos nazistas durante a última guerra mundial, sugeriu que este diálogo fosse direcionado, acima de tudo, no sentido de estabelecer uma sincera amizade entre os participantes. Foram necessários anos. Isso permitiu passar à redescoberta do imenso patrimônio que une a Igreja e Israel e tantos elementos que a tradição espiritual dos padres e a monástica herdaram da espiritualidade de Israel.
Graças a este método e a este percurso, pode-se passar sucessivamente ao exame apaixonado, mas sereno, dos aspectos que diferenciaram a experiência e a mensagem de Jesus e da Igreja a respeito do judaísmo da diáspora. Enfim, chegaram à mesa também as problemáticas conexas com o hebraísmo moderno e o Estado de Israel. D. Innocenzo Gargano juntamente com a professora Lea Sestieri, hebréia, residente em Roma, foram os principais artífices deste perseverante e frutuoso caminho. Um fruto muito precioso deste caminho por etapas, foi a recente abertura do diálogo hebraico-cristão com o terceiro interlocutor da família de Abraão, o Islam. Assim, nos últimos cinco anos, o diálogo tornou-se hebraico-cristão-muçulmano. É possível facilmente imaginar quanto isso, na sua pequenez, possa contribuir para formar homens e mulheres apaixonados pela paz e, portanto, determinados a fazerem-se operadores de paz no contexto fortemente conflitante deste nosso tempo.
O Ashram de Shantivanam (Índia), fundado nos anos ’50 e animado sucessivamente por três grandes pioneiros do diálogo inter-religioso e da inculturação do monaquismo beneditino na Índia, Pe. Jules Monchanin (+1957), Pe. Henry Le Saux (+1968), Pe. Bede Griffths (+1994), desenvolveu por mais de 50 anos um papel de significativa relevância, ao menos a nível simbólico, para uma fecunda relação de experiência entre o monaquismo beneditino e a espiritualidade das grandes tradições religiosas da Índia. Pe. Bede Griffiths, em 1981, pediu a agregação do Ashram à comunidade de Camáldoli. Acreditava ser importante que uma experiência tão inovadora estivesse coligada a uma tradição antiga e ao mesmo tempo aberta à vida comunitária, à solidão e ao testemunho de acolhida.
Na Itália adquiriu uma forma regular, há mais de 10 anos, no pequeno eremitério de Monte Giove, um inédito diálogo com os não-crentes e com pessoas que, há tempo, haviam deixado a prática da vida eclesial. A carismática personalidade de D. Benedetto Calati foi o elemento catalisador que suscitou este especial diálogo. Expressão típica da sociedade secularizada, estas pessoas encontram no ambiente monástico e nos seus valores essenciais e simples, ao mesmo tempo, uma nova oportunidade para reabrir uma busca espiritual sincera e às vezes dramática.
A relação com estas pessoas é surpreendente e estimulante. É surpreendente como sentem o chamado dos grandes temas da espiritualidade monástica, do seu relativo distanciamento das pesadas estruturas jurídicas da Igreja, da sua dinâmica de fraternidade que se faz acolhida e participação na fadiga do viver de cada homem e de cada mulher. Ao mesmo tempo essas pessoas mostram grande capacidade de atualizar aqueles mesmos valores para as suas vidas e para a sociedade de hoje. Este diálogo impele a comunidade monástica a não viver voltada para o passado ou fechada em si mesma, mas a radicar-se no hoje de Deus com as suas incógnitas e a sua promessa de presença indefectível até o seu retorno glorioso.
Caminhar junto com rostos conhecidos e desconhecidos, escutando o calor que a voz secreta do Espírito acende no coração de cada um, pode conduzir-nos à revelação surpreendente do rosto de Cristo no cair da tarde de Emaús:“Fica conosco, Senhor, pois já é tarde!” (Lc 24,29) 


D. Emanuele Bargellini, OSB Cam
Mosteiro da Transfiguração
Mogi das Cruzes – São Paulo, Brasil
Um episódio significativo